quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Meu avô, Stefan Jarocki

Foto do passaporte
o carimbo está ilegível

Stefan Jarocki nasceu em 03 de janeiro de 1899 em Poznan - Polônia, filho de Jan Jarocki e Valentina Kowalska, chegou ao Brasil em 24 de junho de 1924 e desembarcou na Guanabara. Esta é a informação que consta em sua carteira de identidade de estrangeiro.  A história que eu conheço desde criança é que para fugir da guerra (Polaco – Soviética), os pais preferiram que ele fosse embora vivo pois já tinham perdido filhos mais velhos em combate, então ele embarcou num navio cargueiro com mais dois amigos clandestinamente e partiu sem rumo. Depois de passarem muita fome e sede foram descobertos pela tripulação e como marinheiros pagaram o resto da viagem. Meu avô dizia que poderia ter desembarcado nos Estados Unidos mas preferiu ficar no navio e veio pro Brasil. Em seu passaporte (o documento está impresso com dois idiomas: inglês e árabe) provavelmente dado a ele no navio, está anotado em inglês que a validade do mesmo era unicamente para aquela viagem e dá a ele autorização para permanecer como marinheiro com a seguinte data: 10 de junho de 1925. Aqui temos a primeira divergência de datas pois de acordo com o seu RG ele desembarcou em 1924.

Depois disso tem uma lacuna de 6 anos aproximadamente e já temos Stefan morando em São José do Rio Preto, interior do estado de São Paulo, casado com Ida Petrucci, filha de Thomaz Petrucci e Angelina Bertoldo, natural de Sertãozinho em 19 de maio de 1910. Calculo esse espaço de tempo pelo nascimento do filho mais velho Pedro Wilson Jarocki em 29 de junho de 1931, meu pai. 
Pedro Wilson Jarocki - 1932
Eles tiveram mais três filhos nessa ordem: Valentina Irene Jarocki (21 de outubro de 1932), Walter Jarocki (4 de setembro de 1934) e Vanderlei Jarocki (15 de novembro de 1937). Em 15 de dezembro de 1938 ele dá entrada em São José do Rio Preto ao seu primeiro documento aqui no Brasil, a carteira profissional com a qualificação para motorista e mecânico que foi entregue em 7 de janeiro de 1939. Nela temos a segunda divergência de datas, o nascimento dele está assinalado em 3 de setembro de 1899 e a data de nascimento de Valentina também difere. O primeiro emprego registrado foi no S.A. Frigorífico Fazenda Garirova (01/05/1937 a 11/05/1939). Os registros seguintes são: Serraria Progresso (01/06/1939 a 30/09/1939), Agência Ford Germano Sestini (10/10/1939 a 30/05/1942), J. P. Urner & Cia. Ltda. – Obras Swift (30/10/1942 a 03/11/1942), Empresa de Transporte Rio Preto Ltda. (22/02/1943 a 30/06/1944), Cia. Swift do Brasil S. A. (06/07/1944 a 19/11/1945), Agência Chevrolet (19/11/1945 a 15/10/1947), Duarte Barreto e Cia. (03/11/1947 a 31/12/1948), Auto Cruzeiro Ltda. (01/03/1949 a 09/04/1951). Todos estes empregos foram na região de São José do Rio Preto. A permanência nessa região, início de sua família e criação dos filhos foi cheia de dificuldades. Barreira da língua, escrita, eram tempos muito difíceis para todos. Com exceção de Ida, que cuidava do lar e educação dos filhos, todos ajudavam em trabalhos de acordo com suas idades. 


Bodas de Prata - 19/09/1954
A esquerda: Valter (20), Valentina (22), Pedro Wilson (24) e Vanderlei (17),
sentados o casal Ida (44) e Stefan (54) em São Paulo
Em 1952 a família se transferiu para a capital, São Paulo e tiveram a ajuda do Compadre José Suzano que na época trabalhava como gerente do Cinema São José do Belém e como a sala de projeção era grande ele conseguiu autorização e fechou com tábuas uma parte transformando em dois cômodos onde os Jarocki moraram durante xx meses. Nesse tempo, papai trabalhava no cinema como lanterninha e tia Noca (Valentina) na bomboniere e eles assistiam todos os filmes e sabiam os nomes de todos os atores. Depois de adaptados e com conhecimento, mudaram-se do cinema para uma casa na Rua Frei Celso 32, Tatuapé, e organizaram a vida. Lá tinha sempre muita gente pois além dos seis da família, havia um quarto nos fundos que servia de “pensão” para os sobrinhos que vinham do interior para trabalhar na capital. Na carteira profissional de Stefan tem mais dois empregos registrados em São Paulo; Garagem e Posto Quarta Parada (01/11/1952 a 10/11/1952) e Sângia S. A. Com. e Ind. (12/11/1962 a 01/11/1967).

Mas outro trabalho de que ele se orgulhava muito era o humanitário que ele realizava através da religião. Segundo tia Noca (Valentina), ele sempre fora aficionado pelo espiritualismo desde a infância quando ainda era coroinha na igreja. Ele participava ativamente chegando a atender pessoas em sua casa o que gerou muitas amizades e gratidão. Podia parecer estranho que um “polaco” participasse de uma religião afrodescendente, mas para ele era normal. Ele não via a espiritualidade como propriedade étnica. Ele era sério e fazia o bem sem olhar a quem. Viveram em São Paulo até 19xx quando Stefan, Ida, Valentina já casada e Vanderlei se mudaram para Brasília onde Valter já estava estabelecido com sua família. Pedro Wilson, também se mudou com a família para Apucarana – Paraná. Mesmo com a distância a família nunca ficou muito tempo sem se ver. Uns visitavam os outros de tempos em tempos. 
Sobre a família, foi atípico não falarem outra língua em casa, comum para imigrantes, mas com dois idiomas tão distintos, meu pai e os tios não aprenderam o italiano e muito menos o polonês. Imagino como deve ter sido no início para meu avô aprender português e se comunicar pois mesmo depois de tantos anos ele ainda falava “enrolado”, a família compreendia mas quem não convivia com ele era difícil entender o que ele dizia. Tenho uma lembrança que quero compartilhar, numa das estadias de meu avô em nossa casa, meu pai convidou um conhecido, também polonês, na mesma faixa etária do meu avô, e eles passaram a tarde toda conversando em seu idioma natal. Eles riram muito, falaram e falaram, nós não entendemos nada mas a expressão de satisfação no semblante deles na hora em que se despediram foi inesquecível. Foi como se estivessem em casa outra vez.


Stefan se correspondia com a família, porém as correspondências eram raras e o endereço se perdeu. Esta foto é a única lembrança. Na legenda ao lado, em tradução livre: "Em 22 de setembro de 194_ comemoramos 50 anos de casamento. Ass. Pai e Mãe." Sentados ao centro Jan e Valentina ladeados pelas noras e netos. Em pé os dois irmãos e as cruzes representam os dois filhos que não estavam presentes na comemoração; Stefan aqui no Brasil e outro irmão falecido na guerra.


Esta foto abaixo é a última com toda a família: Stefan, Ida, filhos e netos. Ela foi tirada em Brasília no dia do casamento de Vanderlei  e Orlandina, em xx de xx de 19xx.  Da esquerda para a direita: Euríco e Valentina com Evandro no colo, Chris, Zelinda e Pedro Wilson, Vanderlei e Orlandina, Valter Júnior, Werlley, Valter e Aparecida, Rose e Wansley. Junto com Stefan e Ida está Euvânia, filha de Valentina. Vanderlei teve três filhos; Ida, Jacqueline e Vanderlei Júnior. Stefan viveu em Brasília até 1973 quando foi vítima de um acidente automobilístico juntamente com Ida e os dois filhos de Valentina. Eles partiram como viviam: juntos.

Família Jarocki